A farmácia estava localizada no centro comercial de Belo Jardim, área nobre, com casas de tecidos, miudezas, materiais elétricos, magazines e, abençoando o progresso, a majestosa igreja consagrada a Nossa Senhora da Conceição, ornamentada pela pracinha, ponto de encontro e paquera da juventude na década de 60.
O farmacêutico, mistura de médico e comerciante, nas tardes longas das cidades do interior, costuma jogar gamão com os amigos e ficava profundamente irritado quando alguém, pra comprar um medicamento, interrompia seu jogo.
Manoel de Rosário, natural de Serra dos Ventos, distrito de Belo Jardim, filho de pais humildes, semi-analfabeto, negro, sem chances de subir na vida na terrinha do bitury tinha, como tantos outros nordestinos, tentado melhores dias em São Paulo. Lá passou três longos anos. Trabalhou duro, economizou dinheiro, comprou roupas novas, um cinturão de couro largo com uma fivela grande e brilhante, uma sapato tipo “cavalo de pau”, sucesso na época. Mas a saudade bateu forte e ele desejoso de mostrar que tinha melhorado de vida, resolveu voltar a Belo Jardim para visitar a família e os amigos.
Sábado, 16 horas. O farmacêutico jogando gamão na calçada da farmácia e lá vinha Manoel de Rosário: 1m90cm de altura, pele negra sob o sol do agreste, blusão e calça LEE, cinturão largo, fivela reluzente, sapato cavalo de pau. Parou em frente e, interrompendo o jogo de gamão, disse:
- Boa tarde. O senhor tem aí band-aid ?
O farmacêutico o olho de cima a baixo e, raivoso por ter sido interrompido o seu lazer matinal, resmungando entre os dentes, respondeu:
- Tenho...
- O senhor me dá dez ?
- Tá aqui os dez band-aid
- O senhor não tem daquele band-aid cor da pele?
Venha cá, rapaz; veja ali aquela casa de Joãozinho, apontando para uma casa comercial que vendia material elétrico. É ali que vende fita isolante.
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